Uma definição de fotografia que gosto bastante afirma que ela é a arte dos encontros; concisa na forma, mas ampla nas reflexões que instiga! Dessa simples premissa podemos assumir que um possível primeiro encontro seria seu ato gerador: a caçada, onde cada disparo do fotógrafo é um evento único que captura um instante dos seus alvos. Outro, mais complexo, poderia ser quando a fotografia está diante de seus leitores, experiência rica em possibilidades e significações, polissêmica, intelectual ou gutural. Recorrente. Cada iteração parece significar um “momento decisivo” para a imagem, pois podemos atribuir importância a ela, ou talvez nos faça sentir algo e por isso desejamos encontrá-la novamente em outra ocasião. A alternativa é o esquecimento.
Com certeza outras possibilidades podem ser elencadas, mas neste caso gostaria de explorar sua negativa. E se cada encontro implica a renúncia de tantos outros? E se o acaso for um complicador grande o suficiente para tornar esses encontros significativos, ocorrências raras? Talvez a definição mais adequada seria a arte dos desencontros então…
Mas se pensarmos que, mesmo em uma cidade caótica como São Paulo, que parece produzir desencontros de todos os tipos e para todos os gostos o tempo todo, ainda assim é possível notar uma certa noção de continuidade e previsibilidade, podemos melhorar nossas chances ao mudarmos nossa percepção. Se alterarmos um pouco nossas próprias rotinas, algumas diferenças se tornam perceptíveis, como uma região comercial em um domingo pela manhã, com suas portas metálicas fechadas e com pouco movimento. Tente se lembrar das lojas de rua que você costuma passar em frente durante a semana, no horário comercial, ou melhor ainda, tire uma foto desses estabelecimentos da próxima vez que passar por eles e tente imaginar o que está pintado nessas fachadas, em suas portas metálicas subtraídas da vista para permitir a livre passagem de seus fregueses.
Permita-se reencontrar essas paisagens à noite, ou em um domingo de manhã. Compare expectativas e realidades… no mínimo talvez você se surpreenda com o resultado! E que tal pensar sobre as relações de identidade entre lugares/habitantes/transeuntes… evoluir esse jogo de observação até que seja possível ver e compreender a cidade em suas múltiplas camadas. Enfim, o que parecem desencontros podem ser apenas potencialidades de outros encontros, e essa é a arte que cidade e fotografia nos oferecem.
* essa série é uma obra em andamento e pode ser melhor visualizada no instagram @7170_barrios. Utilizo do recurso de “empilhamento” sendo possível ver apenas uma imagem de cada vez (“deslizando para o lado”) e assim simulando o funcionamento alternado entre comércio “aberto” e “fechado” inerente às portas metálicas.
* em meu blog pessoal, discuto um pouco mais o processo artístico da série no post https://titobarrios.wordpress.com/2018/07/01/identidades-intercambiaveis/
Agostinho “Tito” Barrios é fotógrafo e pesquisador. Atualmente está cursando Ciências Sociais na UNIFESP, é MA em Comunicação Visual (Fotografia) pela Hertfordshire University, pós-graduado pelo SENAC em Fotografia como Arte Contemporânea e tecnólogo em Fotografia pela FIAM/FAAM. Portfólio: titobarrios.myportfolio.com